O 100º prémio Nobel para a Fisiologia ou Medicina reconheceu, em 2001,
o trabalho dos investigadores Timothy Hunt, Paul Nurse e Leland
Hartwell, que os conduziu à identificação das moléculas-chave que
regulam o ciclo celular em todos os organismos eucariotas, incluindo
leveduras, plantas e animais.
Leland Hartwell (1939-), actualmente director do Fred Hutchinson Cancer
Research Center, Seattle, foi distinguido pelos trabalhos que conduziram à
identificação de genes com funções-chave na regulação do ciclo celular e pela
definição do conceito e mecanismo de checkpoint celular. Utilizando a levedura
Saccharomyces cerevisae como modelo para a análise genética do ciclo celular
identificou, no início dos anos 70, mutações em mais de 100 genes
especificamente envolvidos no controlo da divisão celular e a que chamou genes
CDC (do inglês Cell division control ), provando assim que o controlo do ciclo
celular era determinado geneticamente. No seguimento deste trabalho, o gene
CDC28 foi identificado como responsável pelo controlo da progressão do ciclo
celular através de G1, e posteriormente denominado “start” quando se estabeleceu
que a sua expressão marca um ponto crucial no ciclo celular em que ocorre a
integração do estado de proliferação celular com os sinais intra- e extra-celulares.
Foi também o responsável pela introdução e definição do conceito de checkpoint
celular, que constituiu um marco fundamental no desenvolvimento dos
conhecimentos sobre a regulação do ciclo celular (Hartwell e Weinert, 1989). As
experiências que conduziram a este conceito pretenderam estudar o efeito da
irradiação de células de levedura sobre a progressão do ciclo celular, tendo
demonstrado que as células que contêm danos no DNA, provocados por
irradiação, sofrem uma paragem do ciclo celular.
Paul Nurse (1949-), Director-Geral do Imperial Cancer Research Fund, Londres,
identificou o gene cdc2 numa outra espécie de levedura – Schizosacharomyces
pombe - e demonstrou que a proteína que codifica é responsável pela transição da
fase G2 para mitose. O gene cdc2 viria posteriormente a ser identificado como
homólogo do gene CDC28 de S. cerevisiae isolado por Hartwell, e como envolvido
na regulação de diferentes fases do ciclo celular. O seu homólogo humano,
conhecido como CDK1, foi identificado por Nurse em 1987 a partir de ensaios de
complementação genética utilizando uma biblioteca de cDNAs humanos para
complementar a mutação do cdc2 em S. pombe (Lee e Nurse, 1987). Nurse
mostrou ainda que a regulação da actividade cinásica das CDK depende do seu
estado de fosforilação.
No início dos anos 80 Timothy (Tim) Hunt (1943-), hoje director do Cell Cycle
Control Laboratory Imperial Cancer Research Fund, Londres, com base em
estudos da divisão celular em embriões de ouriços-do-mar (Arbacia) descreveu
uma nova classe de proteínas cuja abundância varia de forma cíclica ao longo do
ciclo celular e que, por esse motivo, denominou ciclinas (Evans et al., 1983).
Demonstrou ainda que a oscilação do nível de ciclinas é regulada através da sua
degradação periódica em pontos específicos do ciclo celular, mecanismo que tem
uma importância fundamental para o controlo do ciclo celular, uma vez que a
actividade das CDK depende da sua associação com ciclinas.
Em resumo, estes três investigadores premiados com o Nobel, em 2001,
descobriram os produtos e mecanismos moleculares básicos de regulação do ciclo
celular. As suas descobertas abriram caminho a uma importante e fascinante área
de investigação, que inicialmente utilizou como modelo organismos muito mais
simples que o Homem. O facto de se ter vindo a demonstrar que os mecanismos
básicos que regulam a progressão do ciclo celular foram extraordinariamente
conservados ao longo da evolução permitiu um grande avanço no conhecimento
do controlo do ciclo celular nas células humanas.
Por outro lado, o facto de os
mecanismos responsáveis pelo desenvolvimento de processos tumorais
resultarem, em última análise, de alterações a nível do controlo da progressão do
ciclo celular, faz com que todos estes conhecimentos adquiram extrema
importância a nível de implicações terapêuticas.
2001 – O Ano do Ciclo Celular