JC e-mail 2719, de 04 de Março de 2005.
Um dia após aprovação, Governo libera R$ 5 milhões para pesquisas
Cautelosos, cientistas alertam que ninguém será curado com a simples aprovação da medida e apontam um longo caminhoHerton Escobar e Lígia Formenti escrevem para ‘O Estado de SP’:O governo esperava só o sinal verde do Congresso para anunciar uma linha de financiamento público para pesquisas com células-tronco embrionárias.
Em maio, um edital de R$ 5 milhões será lançado para custear estudos sobre o uso de células-tronco para tratamento de diversas doenças.
A lista de candidatos inclui desde doenças neurodegenerativas, como mal de Parkinson, até estudos para diabete, lesão da medula espinal e reconstituição de pele, osso e dentes.
Os trabalhos serão financiados em partes iguais pelos Ministérios da C&T e da Saúde.‘Já havíamos acertado uma linha de financiamento de pesquisa com células-tronco adultas e de cordão umbilical.
Agora, com a decisão do Congresso, vamos incluir também as embrionárias’, disse o diretor do Depto. de C&T do Ministério da Saúde, Reinaldo Guimarães.Segundo ele, a escolha dos centros que receberão a verba levará em conta critérios regionais: 30% serão destinados para áreas menos desenvolvidas do país - Norte, Nordeste e Centro-Oeste, com exceção do Distrito Federal.
O dinheiro será usado para custear projetos de pesquisa básica e experimentos com animais.Apesar da euforia em torno da expectativa de liberação das pesquisas – que só depende agora da sanção do presidente Luiz Inácio Lula da Silva –, os cientistas deixam claro que o que está sendo autorizado não é a aplicação de novas terapias, mas a abertura de uma linha de estudo que poderá trazer benefícios médicos a longo prazo.Ou seja: ninguém vai ser curado de nenhuma doença por causa da publicação da lei, pelo menos por enquanto.‘As células-tronco embrionárias têm uma longa caminhada pela frente’, diz o geneticista Carlos Moreira-Filho, diretor-superintendente do Instituto de Ensino e Pesquisa (IEP) do Hospital Albert Einstein e professor do Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade de SP (USP).‘Mas o primeiro passo precisa ser dado, que é permitir as pesquisas com essas células. Sem isso, a caminhada nunca terá início.’
As estimativas para o desenvolvimento dos primeiros tratamentos vão desde 5 anos, para os mais optimistas, até 50 anos, para os mais pessimistas. ‘Não dá para prever quando eles serão realidade. Não é uma panacéia. Precisamos testar a segurança e a eficácia, primeiro em modelos animais, depois em humanos’, explica a pesquisadora Rosalia Mendez-Otero, da UFRJ.Diferenciação celularMais do que uma aplicação terapêutica direta, Moreira-Filho acredita que a principal contribuição das células-tronco embrionárias será para o conhecimento dos mecanismos biológicos que direcionam a diferenciação celular.
Em outras palavras, o que faz com que uma célula-tronco indiferenciada se transforme em uma célula da pele, do coração ou em um neurônio.‘Poderemos entender com muito mais rapidez os processos que governam essa diferenciação’, diz.
Esse conhecimento, por sua vez, poderá ser aplicado à manipulação de células-tronco adultas - talvez até dispensando, eventualmente, a necessidade de uso das embrionárias.‘Ainda temos muito o que aprender sobre os mecanismos por trás da capacidade de diferenciação da célula-tronco’, reforça a geneticista Lygia da Veiga Pereira, da USP. ‘Quem sabe poderemos até ensinar uma célula qualquer a se diferenciar.’As células-tronco podem ser pensadas como células ‘virgens’, capazes de se transformar nos mais variados tecidos do organismo. Além do embrião, elas podem ser encontradas no organismo adulto e no sangue de cordão umbilical.
Mas as embrionárias são consideradas as mais versáteis, pois carregam o potencial para formar praticamente qualquer outro tipo de célula. É a partir delas que se forma todo o organismo humano.
(Colaborou: Cristina Amorim)(O Estado de SP, 4/3)